A ausência de atendimento para famílias enlutadas
depois de perderem um bebê na gestação, no parto ou logo depois do nascimento,
pode desencadear casos de depressão e ansiedade e pressionar o já
sobrecarregado sistema de saúde. A avaliação é da diretora da organização não
governamental Prematuridade, Denise Suguitani. Há 11 anos, a instituição
oferece acolhimento às mães, pais e avós que vivem o luto materno parental.
"O nosso entendimento é que essas famílias,
quando não são acolhidas, geram uma demanda para o sistema do ponto de vista de
saúde mental", informou Suguitani, cuja instituição atua com foco em bebês
prematuros, uma das principais causas de morte neonatal.
"Se as famílias não são acolhidas naquele
primeiro momento adequadamente, para poder processar o luto, isso vai se
acumulando e gera demandas de atendimento, de internação, que poderiam ser
minimizadas”, completou a diretora.
O atendimento psicológico após a alta hospitalar, a
ser realizado, preferencialmente, na residência da família enlutada ou na
unidade de saúde mais próxima, é uma das recomendações da nova Política
Nacional de Humanização do Luto Materno e Parental, em vigor desde agosto, mas
que ainda esbarra em falta de profissionais.
Em Roraima, atuando também como suporte da organização
Amada Helena, Janynnie Matos de Freitas, confirma essa realidade. Ela esteve,
recentemente, na casa de duas mães enlutadas. "Eu fui conversar, orientei,
falei sobre o atendimento online das nossas entidades, mas também do serviço de
psicologia do programa de saúde da família. No hospital, a demanda é alta, e o
atendimento é difícil", informou.
Ela defende que a política seja uma realidade em todo
o país. "A gente sabe que a estratégia de saúde da família tem trabalhado
muito essa questão [da necessidade do atendimento psicológico] junto com a
assistência social, mas ainda é pouco", avaliou Janynnie, que já foi uma
mãe enlutada. “Pai, avô, avó, a família toda sofre”, reforçou.
De acordo com profissionais da saúde, o atendimento
humanizado para famílias em luto, desde a perda, reduz o sofrimento psicológico
de longo prazo. Nesse aspecto, outros pontos da lei que criou a política
nacional também ajudam, como a investigação do motivo da perda ou do óbito, a
possibilidade de se despedir, de registrar ou de enterrar os bebês.
“A despedida mais respeitosa, na qual os pais tenham
apoio para criar lembranças afetivas, tais como fotos, ou possam guardar
digitais, o cordão umbilical ou uma mantinha, sempre respeitando os limites e
desejo de cada um", são importantes para as famílias, explicou, em nota, a
psicóloga especializada em saúde mental perinatal, Marisa Sanchez.
A lei que cria a política da humanização do luto
materno e parental tem outubro como o mês de referência. O objetivo é chamar a
atenção para a necessidade de garantir acolhimento às famílias, por meio de
diretrizes claras para hospitais públicos e privados.
Entre as novas medidas da lei, também está a
necessidade de separação de alas em maternidades para as mães enlutadas, a
presença de acompanhante durante o parto mesmo que o bebê esteja morto e o
direito de sepultar ou cremar o bebê nascido morto, de acordo com as crenças de
cada família.
Quando a lei foi aprovada, o ministro da Saúde,
Alexandre Padilha, garantiu que a pasta adaptaria hospitais públicos de todo o
país. “O Ministério da Saúde vai ter uma política para isso. Terá ações para
apoiar essa reorganização, que vai ser muito positiva para a humanização das
maternidades”, declarou.
Consultado neste mês, o ministério não confirmou
investimentos. Em nota, disse que a implementação da política "é um
processo gradual e articulado”, junto com estados e municípios e “que envolve
adequações organizacionais, formação de profissionais e integração dos fluxos
assistenciais".